Como o Estado apoia o investimento

Para fazer face aos desafios da economia as empresas precisam de dinheiro para apostar na inovação e continuar a trilha da transformação digital. O financiamento público pode ter um papel fundamental neste caminho.

A necessidade de acompanhar a onda da digitalização e uma maior aposta na requalificação de trabalhadores estão no topo das prioridades dos gestores. Mas a maior dificuldade à realização dos investimentos necessários para fazer essas transformações pode estar no acesso ao financiamento, seja público ou privado. Sobretudo num país cujo sistema económico depende, essencialmente, das pequenas e médias empresas, essas barreiras tornam-se ainda mais difíceis de transpor.


Só fomentando a inovação e a transformação digital será possível continuar a garantir a sua competitividade e, consequentemente, a do País, conforme defende o último estudo do Banco Europeu de Investimento (BEI), designado “Digitalização das PME em Portugal: modelos para financiar projectos digitais”, preparado para a COTEC Portugal com o apoio da consultora Oliver Wyman. O documento refere que, embora as condições de acesso ao financiamento tenham melhorado ao longo dos últimos anos, é necessário prestar especial atenção ao desenvolvimento dos negócios em sectores tradicionais, como são os casos da área da construção, do retalho e da hotelaria, onde o incremento da produtividade continua a ser um desafio a ter em conta, de forma a que Portugal possa, assim, convergir com a média europeia.


Segundo o mesmo relatório, o Estado tem vindo a investir numa série de iniciativas e instrumentos financeiros – destinados a diferentes estádios de desenvolvimento das empresas e a diversos sectores de actividade – que incluem a emissão de dívida, a garantia mútua, entre outros, e ainda incentivos fiscais e programas específicos para reconversão e capacitação e Recursos Humanos. Igualmente os consultores do BEI concluíram que, no que diz respeito ao financiamento, existe um ecossistema bem desenvolvido de instrumentos públicos e garantia mútua já se verificou uma melhoria dos instrumentos financeiros de suporte à digitalização através da criação de instrumentos híbridos que substituem incentivos reembolsáveis por crédito bancário acessível. Existem mais de três dezenas de programas estatais para apoiar as empresas nos processos de investimento, geridos por 23 entidades, que directa ou indirectamente, visam os objectivos da Indústria 4.0. Da mesma forma, os quatro principais canais públicos de suporte ao financiamento, a Sociedade Portuguesa de Garantia Mútua (SPGM), a PME Investimentos, a IFD – Instituição Financeira de Desenvolvimento e a Portugal Ventures, poderão ser igualmente canalizados para projectos de digitalização.


O relatório acima referido deixa ainda um conjunto de recomendações destinadas a melhorar e alavancar esta transição. Entre elas estão a necessidade de melhorar e incrementar a utilização dos instrumentos financeiros já existentes, facilitando o acesso da PME a estes utensílios, aumentando assim a produtividade, em particular dos sectores mais tradicionais. “Esperamos que as recomendações do relatório tenham um impacto positivo nos instrumentos de financiamento para apoiar as estratégias de inovação das PME”, afirmou Isabel Furtado, presidente da COTEC Portugal, durante a apresentação do documento, em setembro do ano passado.


Rui Borrego, Manager Head of Innovation for Public Sector da KPMG Portugal, adianta a propósito das conclusões deste estudo, que “o sistema bancário nacional, apesar de ter capacidade para financiar a maioria dos projectos das PME, apresenta algumas barreiras no acesso ao crédito que em muitos casos acabam por limitar o acesso a financiamento. Uma forma de ultrapassar estas barreiras ao crédito passa pela construção de um fundo de garantia mútua que permita diluir o risco da banca comercial nestes projectos. Esta garantia poderia ser financiada pela própria União Europeia ou pelo Fundo de Contragarantia Mútua (FCGM)”. De forma a melhorar a navegabilidade do ecossistema o relatório acima citado ainda recomenda, por exemplo, a construção de portal que concentre a informação sobre os instrumentos públicos de suporte a estes projectos, bem como a simplificação dos processos de candidatura.


O manager da KPMG explica ainda que “o balanço da área de financiamento para i4.0 é moderadamente positivo. Numa perspectiva mais global e de acordo com o Scoreboard i4.0 que avalia a i4.0 em 18 Estados Membros, Portugal tem evoluído de forma positiva na componente de financiamento”. Segundo ele, a fase do I Programa i4.0 permitiu fazer um diagnóstico compreensivo das principais debilidades, e apresentar já algumas melhorias como a modificação de alguns instrumentos públicos de apoio em que a componente reembolsável dos incentivos de apoio foi substituída por crédito bancário garantido e sem juros, melhorando a sua eficiência e aumentado a participação das entidades privadas no financiamento. “Durante a Fase II do Programa i4.0 estão previstas melhorias adicionais nos instrumentos e também a concretização das recomendações de melhoria de navegabilidade do ecossistema de financiamento para projectos de digitalização”, explica.


O documento elaborado pelo BEI recomenda ainda que o País aposte na criação e no desenvolvimento de clusters, bem como na promoção do financiamento para projectos digitais transformadores. Para isso, no entanto, é necessário conseguir um maior equilíbrio nos critérios de ponderação das agências de investimento, de forma a que iniciativas ligadas à transformação digital – muitas vezes com uma componente intangível que dificulta a análise de risco – sejam avaliadas justamente. Sobre este assunto, Jorge Portugal, director-geral da COTEC Portugal, defende “a importância de o sistema bancário desenvolver ferramentas para reconhecer as empresas com processos inovadores, que, em regra, possuem maior potencial de crescimento, exportam mais e, em geral, pagam salários mais elevados, reduzindo assim os riscos de financiamento”. O responsável pela associação aponta ainda que “o financiamento de empresas inovadoras é uma oportunidade para acelerar o crescimento sustentável da economia portuguesa”. Outra das recomendações do BEI e da Oliver Wyman é a necessidade de criar um digital score, que indique a maturidade digital das PME e dos seus projectos. A COTEC avançou já com a criação de uma ferramenta, a THEIA – Technological and Holistic Engagement for Industry 4.0 Assessment, que permite fazer online um diagnóstico da maturidade digital das empresas que o queiram fazer.

Linhas de apoio à disposição
Mas, afinal, que investimento público conseguem as empresas arrecadar para a digitalização? No âmbito dos 33 programas, existem linhas de financiamento cujo apoio pode variar de 30% a 75%. Um incentivo que, no caso do sistema de apoios à inovação produtiva, é concedido em forma de empréstimo sem juros, com maturidade de oito anos, que poderá eventualmente ter uma componente a fundo perdido até 60% do montante, nos casos em que os projectos apresentem metas de superação.


Entre os vários instrumentos públicos existentes que apoiam o investimento na transição para uma economia mais digital, destacam-se dois: os Vale Indústria 4.0 e o Sistema de Incentivo à Inovação Produtiva i4.0. O primeiro permite às empresas terem um primeiro contacto com o digital e efectuarem experimentação sem risco, já que é um instrumento a fundo perdido. Direcciona-se a PME que queiram apostar na digitalização do seu negócio, seja através da criação de um site de comércio eléctrónico, seja através marketing digital, entre outros, cobrindo até 75% das despesas elegíveis, num tecto máximo de 7.500 euros. Segundo dados do IAPMEI estes vales deverão apoiar mais de 1.500 empresas, representando um investimento público de 12 milhões de euros. Já o Sistema de Incentivo Inovação Produtiva apoia projectos transformadores e de grande escala, associados à digitalização nas PME nacionais. Trata-se de um sistema híbrido que combina um incentivo não reembolsável e um instrumento financeiro de garantia com isenção de juros, cujo apoio oscila entre os 15 e os 75%.


Além destes, existem ainda programas que prevêem incentivos à contratação de consultoria na área da transformação digital para ajudar as empresas a adaptar o negócio e a estrutura às novas exigências de mercado. Os apoios podem chegar aos 75% do montante financiado. Por outro lado, o Estado procura ainda incentivar o investimento através de benefícios fiscais, opção que pode ser conciliada com apoios à compra de equipamento. O salto para o digital tem de ser feito também com a qualificação dos recursos humanos, sendo essencial olhar para a formação como passo para a inovação e maior competitividade.

Principais objetivos do Programa Indústria 4.0, integrado na Estratégia Nacional para a Digitalização da Economia

Acelerar a adopção da i4.0 pelo tecido empresarial português
– Dotar o tecido empresarial de conhecimento e informação
– Promover um conjunto de activos que facilitem a transformação empresarial
– Capacitar e reajustar a força de trabalho nacional

Promover os fornecedores tecnológicos portugueses como players i4.0
– Capitalizar o ecossistema científico e tecnológico
– Criar um contexto favorável ao desenvolvimento de startups i4
– Promover soluções tecnológicas nacionais em contexto internacional

Tornar Portugal um polo atrativo para o investimento em i4.0
– Comunicar o país enquanto hub de partilha de experiências e know-how para atracção de recursos
– Criar condições favoráveis (legais e fiscais) para o investimento direcionado à i4.0

11 iniciativas a ter em conta para o sucesso da Indústria 4.0

  1. Avaliação da Maturidade Digital
  2. Experiência da Indústria 4.0
  3. Estímulo à inovação
  4. Treinamento e Desenvolvimento Setorial e Digital
  5. Fábricas de Aprendizagem
  6. Experimentação e Formação On-job
  7. Conectividade digital
  8. Coaching Indústria 4.0
  9. Gestão de Riscos em Inovação
  10. Acesso ao Financiamento
  11. Financiamento e Transformação

Fonte: COTEC Portugal

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